Com colaboração de Marcelo Tanos*
Por intermédio da REN 482 (Resolução Normativa n.º 482/2012) da ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica) foram estabelecidas as condições gerais para o acesso de unidades de micro e minigeradores distribuídos ao sistema de distribuição de energia elétrica, bem como instituído o sistema de compensação de energia elétrica.
A partir desta medida, foi facultada ao consumidor brasileiro a possibilidade de geração da sua própria energia elétrica a partir de fontes renováveis – solar, eólica, hidráulica e cogeração qualificada –, bem como de fornecer o excedente de energia para a rede de distribuição de sua localidade – a título de empréstimo gratuito – para posterior consumo mediante sistema de compensação de energia elétrica instituído pela resolução.
Desde a implementação desta nova e relevante modalidade de geração, muito tem se falado sobre a necessidade de reequilibrar a regulamentação de modo que os demais consumidores não sejam onerados em decorrência de subsídios conferidos aos consumidores que geram a sua própria energia – como no caso das unidades de micro e minigeradores distribuídos.
Isso porque tais unidades, também chamadas prossumidoras, não suportam determinadas cobranças relativas ao uso do sistema de distribuição afetas a componentes tarifárias, encargos e perdas técnicas, as quais são devidas pelos demais usuários do sistema de distribuição – resultando no estabelecimento, portanto, de subsídio cruzado entre consumidores, o que deve ser objeto de lei e não de resolução setorial.
Nesse contexto, foram promovidas a Consulta Pública ANEEL n.º 25/2019 e a Audiência Pública ANEEL n.º 40/2019, que tiveram por objetivo a obtenção de subsídios e informações adicionais para a minuta provisória de texto que vai alterar a REN 482, a qual é resultado da Audiência Pública n.º 001/2019 e foi alvo de severas críticas por parte da sociedade e do Congresso Nacional.
Como a minuta provisória de texto impõe aos micro e minigeradores distribuídos demasiado aumento de custos para a utilização do sistema de distribuição, o regulamento em elaboração se revela contrário aos estímulos à geração distribuída e à autoprodução de energia, bem como desconsidera os principais benefícios decorrentes de tal modalidade de geração, como a postergação de investimentos nos sistemas de distribuição/transmissão e o alívio nas redes, o que contribui para o aumento da vida útil de condutores e de outros equipamentos existentes ao longo de uma linha de distribuição/transmissão.
É importante mencionar que o Congresso Nacional está intimamente envolvido com o tema e bastante comprometido com a difusão da tecnologia de geração de energia elétrica por meio da modalidade de geração distribuída, havendo, inclusive, uma predisposição para que o assunto seja tratado via lei e não por meio de resolução da ANEEL, o que sanaria, concomitantemente, quaisquer questionamentos relativos à existência de subsídio cruzado consubstanciado em incentivos direcionados aos micro e minigeradores distribuídos, relativos aos custos de utilização do sistema de distribuição local.
Apesar da previsão inicial para implementação da nova regra em 2020, tem-se que até a presente data a agência não publicou o novo regulamento, o que está – atualmente – previsto para o primeiro trimestre de 2021.
Fato é que a pandemia ocasionada pela Covid-19 impactou a agenda da ANEEL e de outros órgãos da administração pública, que voltaram seus esforços para a aprovação de medidas urgentes e extraordinárias para a contenção da crise recentemente vivenciada e ainda percebida a nível mundial.
Ademais, diante do evidente interesse manifestado pelo Congresso Nacional, pode-se concluir que a ANEEL, provavelmente, aguardará que o Poder Legislativo aprove projeto de lei sobre o tema em referência até o encerramento do primeiro trimestre de 2021.
Caso contrário, a agência poderá publicar a minuta provisória de texto resultado da Audiência Pública n.º 001/2019, a qual se mostra desfavorável ao desenvolvimento da geração distribuída no país e comprometerá inúmeros empreendimentos de geração em operação e em implantação. Sob esse aspecto, ressalta-se que se encontram em trâmite avançadas propostas de revisão da REN 482 por meio de projetos de lei:
- O PL 2215/2020, que visa alterar a Lei 9.074/1995 para estabelecer o SCEE (Sistema de Compensação de Energia Elétrica);
- O PL 5829/2019, que tem por objeto alterar a Lei 9.427/1996 para reduzir as tarifas de uso dos sistemas de distribuição/transmissão e os encargos incidentes nas unidades consumidoras nas quais a energia proveniente de geração distribuída será compensada e;
- O próprio PL do CBEE (Código Brasileiro de Energia Elétrica), que tem por objetivo unificar todo o vasto regulamento existente em um único código, conferindo maior segurança jurídica e solidez para o setor elétrico.
A edição de regulamentos referentes ao setor elétrico deve ser necessariamente pautada em políticas e diretrizes previamente estabelecidas pelo Governo Federal, o que se justifica diante da necessidade de se manterem os objetivos a serem alcançados pelos regulamentos, evitando-se, dessa maneira, comandos desproporcionais ou desarrazoados, que fogem das finalidades originariamente previstas pela norma, bem como assegurando pleno acesso aos serviços de energia elétrica.
Diante disso, é esperado que a nova norma que disciplinará a modalidade de geração distribuída consista em comandos legais exequíveis, de fácil entendimento e aplicação, proporcionando relação pacífica e equilibrada entre os agentes setoriais, o que se dará por meio da edição de dispositivos regulatórios estáveis e que resultem em segurança jurídica para os envolvidos, de forma a evitar tratamentos injustos que, a seu turno, desencadeiam recursos administrativos e judiciais, degradando, em consequência, as relações que deveria, na verdade, harmonizar.
*Advogado e Sócio-Fundador da LTSC Sociedade de Advogados, com especialização em Direito Regulatório e Direito da Energia pelo CEDIN (Centro de Direito Internacional) e pelo IAED (Instituto de Altos Estudos em Direito). Membro fundador da ABDEM (Associação Brasileira de Direito da Energia e do Meio Ambiente) e integrante do Comitê de Gás Natural. Vice-Presidente da Comissão de Direito da Geração Distribuída da OAB/MG.
3 respostas
No Brasil se tem uma cultura de nadar pra trás, tudo regride em vez de progredir, mas isso se chama lucro para os grandes, se pensar no benefício para a população em detrimento dos poucos e grandes empresários interessados o povo, esta sempre irá perder, porque nenhum político trabalha para o povo e sim em si próprio e seus interesses e afiliados, porque o congresso em vez de trabalhar para criar leis que beneficiam a população ficam só fazendo CPI disso, CPI daquilo e não Leis que estão lá para criar e discutir, não fazem nada útil, aposto que se o Marco Energético fosse de interesse deles no outro dia já estaria votado, mas infelizmente o dia que o povo não for obrigado a votar e souber votar corretamente seremos um novo Pais.
Enquanto vários países dão incentivo a produção própria de energia de seus cidadãos o Brasil vai na contramão, dificultando e prejudicando quem gera energia emprego renda e ainda alivia o sistema elétrico nacional e contribui com a melhoria do clima e o ar do planeta. Deveríamos incentivar mais ainda esse segmento.
Correto, alem de presenvar os depósitos hídricos para consumo, irrigação, etc